Quando os portugueses desembarcaram em terras brasileiras em 1500, não perderam tempo para oficializar sua presença: apenas quatro dias depois, em 26 de abril, o frei Henrique de Coimbra celebrou a primeira missa em solo brasileiro. Ele era um dos integrantes da expedição de Pedro Álvares Cabral. O local escolhido foi a praia de Coroa Vermelha, no litoral sul da Bahia, onde os portugueses tiveram seus primeiros contatos com os povos originários.
“Mais do que um simples rito religioso, a primeira missa celebrada marcou simbolicamente o início da presença europeia e do cristianismo em terras até então desconhecidas pelos europeus. Era também uma maneira de afirmar, diante dos olhos indígenas e do próprio império português, o domínio que começava a se desenhar”, conta Ana Paula Aguiar, autora de História, Filosofia e Sociologia do Sistema de Ensino pH.
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A carta de Pero Vaz de Caminha
O que sabemos sobre essa missa foi registrado por Pero Vaz de Caminha, escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral. Em sua carta ao rei Dom Manuel, ele descreveu a cerimônia e os primeiros contatos com os povos indígenas, retratando-os de maneira idealizada. “Ele descreve os indígenas com um olhar que mistura curiosidade, espanto e exotização, ressaltando sua nudez, beleza física e modos de vida, sempre sob uma ótica europeia”, explica Ana.
Segundo ela, esse discurso ajudou a reforçar a ideia de que os indígenas precisavam ser “civilizados”, legitimando a colonização e suas consequências.
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A pintura de Victor Meirelles: um retrato fiel?
Mais de 300 anos depois, no século 19, a cena da primeira missa foi imortalizada pelo pintor Victor Meirelles em sua obra “Primeira Missa no Brasil” (1860). Inspirado na carta de Caminha, o artista criou uma composição que se tornou um ícone nacional. Mas será que o quadro é um retrato fiel da história?
A resposta é não. “A pintura idealiza o evento, reforçando a narrativa de uma colonização pacífica e religiosa, omitindo os conflitos, as violências e assimetrias de poder que marcaram esse processo”, explica Ana.
Entre os mitos perpetuados pela obra, a professora Ana destacar:
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A suposta harmonia entre indígenas e portugueses: na pintura, os povos originários aparecem pacificamente assistindo à cerimônia, o que não reflete as tensões e imposições do encontro colonial.
A colonização como um evento civilizatório: a missa é representada como um momento de elevação espiritual dos indígenas, ignorando a violência e o apagamento cultural que se seguiram.
A ausência de conflitos: a cena transmite uma falsa impressão de aceitação imediata dos portugueses pelos nativos.
Mas há também elementos historicamente precisos:
A presença de figuras religiosas e militares, coerente com o contexto da época.
O altar improvisado, conforme descrito por Caminha em sua carta.
A centralidade da fé cristã como ferramenta de dominação colonial.
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O contexto político que influenciou a obra
Vale lembrar que a pintura não foi criada à toa. Segundo a professora Ana, no século 19, o Brasil vivia o Segundo Reinado e Dom Pedro II investia na construção de uma identidade nacional. Obras como a de Meirelles foram encomendadas para reforçar um discurso patriótico e legitimar a monarquia como herdeira do passado colonial. “O Império queria exaltar a missão civilizadora portuguesa e a fé católica como pilares da nação. A pintura serviu como instrumento de poder e legitimação da história oficial”, ressalta a docente.
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